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terça-feira, 3 de abril de 2012

É possível ser feliz longe de casa

Asilos na cidade provam que a ideia de tristeza e abandono é coisa do passado

Por Márcia Casali

O Estatuto do Idoso é uma conquista para o país, que passou a ter uma Política Nacional para milhares de idosos. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), há uma estimativa de que no Distrito Federal existam 127 mil idosos e no Brasil, cerca de 19 milhões com mais de 60 anos. As políticas públicas voltadas para os idosos são novas e o envelhecimento tornou-se questão fundamental. Houve melhorias, mas muita coisa ainda precisa ser feita.

Um grande desafio no país é o controle e fiscalização das Instituições de Longa Permanência (ILPI). Conhecidas pelo trabalho de amparo e assistência a idosos abandonados ou sem família. No DF apenas 13 instituições fazem parte do Conselho dos Direitos do Idoso (CDI). Órgão responsável por acompanhar e fiscalizar todas as ações voltadas para o idoso na cidade. De acordo com o secretário-executivo do CDI, Luiz César Fiúza, a lei precisa ser cumprida e os idosos merecem tratamento digno. “Estar com a família é fundamental, mas presenciei casos onde a melhor solução era um abrigo”, diz Fiúza que tem como proposta realizar visitas permanentes aos asilos, com cronograma independente de denúncias.

Atendimento e convívio com a sociedade

A assistente social Lis Alecrim, do Lar de Velhinhos Maria Madalena, reconhece a importância do Estatuto, além do desafio do serviço social, mas também diante da questão do idoso institucionalizado. Para ela o asilo ainda é carregado de estigmas, que foram construídos no decorrer dos anos, como abandono e negligência. “Atualmente as Ilpi´s mudam esse paradigma de abandono, fazendo do abrigamento a melhor possibilidade de qualidade de vida para o idoso. Onde atividades de integração, cultura, lazer, esporte, dentre outras são desenvolvidas”, explica Lis. Ela reforça que o meio familiar deve ser a primeira opção por ser o ambiente que o idoso está habituado. “A decisão não pode ser apenas dos familiares, mas também do próprio idoso, que muitas vezes se sente solitário”, afirma.

Jorge da Silva, 66 anos, e Glória Nery, 67, são conhecidos no lar pela história que os envolvem. Ela está no lar há vinte e oito anos e Jorge há um. Para a técnica de enfermagem, Ana Paula Neves, assim que Jorge chegou a casa, foi logo se engraçando por ela. Ficaram amigos, começaram a namorar, até que um dia resolveram casar. “Na época procurei o presidente da instituição, Nivaldo Torres Vieira para tratar do assunto. Diante da situação, tendo em vista que são dois idosos lúcidos, o lar realizou o casamento em 17 de abril de 2010, com tudo o que os noivos tinham direito. Vestido de noiva, tapete vermelho, padrinhos e bolo.

Para abrigar o casal, a direção aproveitou uma suíte ao lado do Departamento de Integração. “A casa foi mobiliada com geladeira, televisão, cama, sofá e banheiro. Menos fogão, para evitar acidentes”, explica Ana, enfatizando que a medida foi visando a segurança do casal, pois uma das regras da casa é usar o refeitório. Segundo Glória, estar no lar é uma grande felicidade. “Gosto de morar aqui. Além das atividades diárias, sempre temos algo para fazer, como sair para dançar e ir a clubes”, comenta Glória.

Dentre os moradores da casa, alguém que também se destaca é a primeira moradora da casa, Maria Irene Gomes, 81 anos. Ana explica que Maria chegou a casa com uma perna amputada. “Durante muito tempo ela usou uma prótese. Hoje está na cadeira de rodas, mas é totalmente independente”, comenta. Para Ana ela é uma idosa, que mesmo estando em uma instituição, é alegre, participativa e tenta se inserir em tudo. “Mesmo não enxergando direito ela ainda faz crochê, está na oficina de customização e estuda. Ela não faz da deficiência um empecilho”. Segundo Maria Irene no lar ela encontrou amigos e é o lugar que ela gosta de estar. “Aqui eu tenho tudo o que preciso, além dos meus amigos”, diz.

Os idosos contam com uma programação diária que inicia no café da manhã, às 7h15, e encerra com a ceia, às 20h. Todos os dias, eles participam de atividades recreativas e cognitivas, com quebra cabeça, dominó e xadrez, que requerem esforço mental. Eles ainda participam de musicoterapia, filmes, oficina da memória, customização de objetos, bordados, terapia ocupacional, massagens e alfabetização, por meio do projeto Luz das Letras. “O objetivo é encaixar atividades da melhor maneira possível, para que eles tenham sempre o que fazer”, diz Ana.

Lar se mantém com a ajuda da população

Fundado há 26 anos pela Renovação Carismática, o lar Comunidade de Renovação Esperança e Vida Nova (Crevin) abriga 33 idosos, sendo 17 mulheres e 16 homens. A instituição é mantida por doações e acaba de se inscrever para receber auxílio do GDF. Segundo o administrador, João Cardozo Souza, com a ajuda é possível construir outro andar com mais quartos. “A despesa com fraldas, remédios e roupas é alta. Por isso realizamos eventos para completar a renda”. Ele reforça que a instituição não visa fins lucrativos e o governo só contribui com o pão e o leite diariamente.

O abrigo tem dois andares com 18 quartos, além de salas de televisão, refeitório, enfermaria e sala de nutrição. Além de um espaço reservado para pessoas da comunidade que realizam trabalhos manuais para contribuir com a casa. O quadro de funcionários do local é composto, também, por voluntários. O bombeiro aposentado, Ivan Pereira dos Santos, 50 anos, colabora com a casa desde a fundação. “Antes eu ajudava na cozinha. Agora estou substituindo o motorista”, comemora Santos.

Cerca de dez idosos da Crevin, ou não têm família, ou foram abandonados. Souza conta a história de uma senhora que tinha 13 filhos, mas só um dava a assistência necessária. “Bastava ligar no serviço que ele vinha na hora”, diz Souza. Ele comenta que os outros filhos chegaram a ficar mais de três anos sem visitar a mãe. Segundo ele, nem todos recebem visitas com freqüência. No lar há cinco anos, José Ferreira de Lima, 69, conta que era alcoólatra e precisou de ajuda para deixar o vício. Após cinco derrames, ele foi abandonado pela mulher. O único contato com a família são as visitas do filho “Eu sabia que aquilo não era um meio de vida”, lembra José.

Para o advogado aposentado, Antônio Caruso, 79 anos, o lar oferece tudo o que ele precisa. Após longos anos na casa da irmã, chegou um momento que ele precisava de cuidados especiais, algo que a irmã não tinha condições de fazer. Caruso passa grande parte do tempo lendo revistas e afirma que gosta de estar num abrigo. “Indicaram a Crevin para minha irmã, por ter boas referências. Aqui eu tenho tudo o que preciso”, afirma Caruso.

Por meio da assessora, Sueli Rochedo, a Subsecretaria de Assuntos para a Terceira Idades do DF (Subati/DF), informou que na ausência da família ou de condições financeiras, o Estado custeia a permanência do idoso em algum asilo. “O Estado faz o encaminhamento para uma Ilpi e paga as diárias”, explica Sueli.

Colaborou: Kécia Pereira

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